Como o desmatamento na Floresta Amazônica pode ter efeitos colaterais para o clima em regiões distantes
Entenda porque a Amazônia é vital para o mundo
Você já ouviu falar no Efeito Borboleta?
É uma expressão utilizada na Teoria do Caos para fazer referência a uma das características mais marcantes dos sistemas caóticos: a sensibilidade nas condições iniciais.
A Teoria do Caos consiste na ideia de que pequenas mudanças no início de um evento podem desencadear alterações drásticas, profundas e imprevisíveis ao longo do tempo.
Podemos usar a teoria do caos para explicar o que está acontecendo com o meio ambiente.
O clima da Terra é controlado por uma complexa rede de interações entre sua atmosfera, oceanos, solos, gelo e biosfera.
Os componentes do sistema Terra têm um limiar crítico além do qual um sistema se reorganiza e são chamados de elementos de ruptura. Estes elementos de ruptura incluem o bioma Amazônia, as placas de gelo da Antártica Oriental e Ocidental, o permafrost ártico e a Grande Barreira de Corais, na Austrália, entre outros.
Existe a teoria de que um ponto de ruptura, ou ponto de inflexão, alcançado em uma região poderia desencadear um ponto de ruptura em outra, e assim por diante, como a derrubada de dominós, explica Jingfang Fan, cientista do sistema terrestre da Universidade Normal de Pequim, na China, e do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático (PIK), na Alemanha.
Vários estudos, de diferentes laboratórios do mundo, com estratégias científicas distintas, apontam que as mudanças climáticas em curso, pelas ações da humanidade, estão atualmente levando elementos deste sitema a limites extremos, a beira de pontos de inflexão, para além dos quais as mudanças se tornariam um ponto sem volta, fazendo com que todo o sistema terrestre se transforme em um novo estado possivelmente hostil à vida em suas formas atuais.
A floresta Amazônica distribuída entre Peru, Bolívia, Colômbia, Equador, Venezuela e Brasil abriga uma imensa biodiversidade, e é fundamental para impedir o avanço das mudanças climáticas
São inúmeros os benefícios da Amazônia, por exemplo: uma árvore com copa de 10 metros de diâmetro, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, tem capacidade de bombear mais de 300 litros de água para atmosfera.
Seus rios respondem por quase um quinto da água doce que deságua nos oceanos, e a umidade de parte da Bacia Amazônica atinge e regula o clima de países como a Argentina e Uruguai.
A Amazônia, juntamente com as outras florestas tropicais, preservam o maior estoque de carbono do mundo. Se bem ajustado, o mecanismo hidrológico da Amazônia desempenha um papel primordial na manutenção do clima mundial e regional. A água que as plantas liberam na atmosfera por meio da evapotranspiração e que os rios despejam no oceano influencia o clima do planeta e a circulação das correntes oceânicas.
Há uma expressão recente, que se tornou popular entre os cientistas climáticos: “O que acontece no Ártico fica no Ártico”, novas pesquisas acrescentam ao nosso entendimento que, da mesma forma, o que acontece na Floresta Amazônica não fica na Floresta Amazônica.
Estudo publicado na revista Nature Climate Change (Liu, T., Chen, D., Yang, L. et al. Teleconexões entre elementos basculantes no sistema terrestre. Nat. Clim. Chang. 13 , 67–74 – 2023) mostra que o desmatamento na Floresta Amazônica pode ter efeitos colaterais para o clima em regiões distantes, potencialmente pressionando elementos-chave do sistema climático global em direção a pontos de ruptura climática que podem ser catastróficos para a humanidade e para a biodiversidade de nosso planeta.
O estudo analisou 40 anos de medições de temperatura do ar em mais de 65 mil locais ao redor do mundo para investigar como as mudanças em uma região se propagam através do sistema climático, afetando as temperaturas em outras partes do globo.
Os pesquisadores identificaram uma forte correlação entre as altas temperaturas na Floresta Amazônica e no Planalto Tibetano; o desmatamento na Amazônia provavelmente influencia a neve no Tibete através de um percurso de 20 mil quilômetros movido por padrões de circulação atmosférica e oceânica.
O estudo sugere que uma Amazônia saudável e funcional é crucial não apenas para o clima regional no Brasil, mas para todo o sistema terrestre.
Na Amazônia, o ponto de inflexão é a capacidade da floresta de se sustentar por si própria. O processo de transição, levado pelo desmatamento com mudanças do cima já alterou vários aspectos do seu ecossistema. Um deles é a fotossíntese, processo realizado pelas plantas para a produção de energia, no qual a captura de CO2 é essencial. “Sob o estresse de temperaturas mais elevadas, a quantidade de gás carbônico assimilada pela fotossíntese da floresta está diminuindo drasticamente”.
Outra mudança importante é sobre a precipitação de chuvas. “Muitas áreas do nosso planeta já estão começando a ficar muito mais secas, e uma delas é a área central do Brasil e a parte oriental da Amazônia, onde há decréscimo muito significativo da precipitação. Já a área mediterrânea da Europa (sul da Espanha, Portugal e Itália) está em processo acelerado de desertificação, assim como na América Central e na parte central dos EUA. “Isso traz um ingrediente crítico para a produção de alimentos. E não se trata de uma previsão para o futuro. Isso já está acontecendo.”
O alerta foi feito pelo cientista Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) e autor-líder de um capítulo do mais recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em uma palestra na conferência anual do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI).
Qualquer dano, é muito difícil de ser recuperado, toda a vez que ocorreram extinções de espécies associadas ao clima, e isso ocorreu várias vezes, foram necessários milhões de anos para o ecossistema se recuperar.
Por isso é importante a preservação da biodiversidade (conjunto de todos os seres vivos existentes, o que inclui todas as plantas, animais e microorganismos da Terra). Pois é justamente essa diversidade e a interação entre estas diferentes espécies que torna nosso planeta tão especial.
Como a maior floresta tropical do mundo, a Amazônia possui a maior biodiversidade, com uma em cada dez espécies conhecidas.
Assegurar a biodiversidade é importante porque ela garante maior sustentabilidade natural para todas as formas de vida, e ecossistemas saudáveis e diversos podem se recuperar melhor de desastres, como queimadas.
Preservar a biodiversidade amazônica, portanto, quer dizer contribuir para estabilizar outros ecossistemas.

