CRÍTICA – Maratona Oscar – Zona de Interesse /2023
Zona de Interesse (The Zone of Interest) – EUA, Polônia, Reino Unido, 2023 – Direção: Jonathan Glazer
O longa vencedor do Grand Prix no Festival de Cannes de 2023 e com cinco indicações ao Oscar 2024, incluindo Melhor Filme e Melhor Filme Internacional, é livremente baseado no romance homônimo de Martin Amis de 2014 e se passa durante a Segunda Guerra Mundial, e retrata o holocausto.
Rudolf Höss (Christian Friedel), o comandante de Auschwitz, e sua esposa Hedwig (Sandra Hüller), desfrutam de uma vida aparentemente comum e bucólica, em uma casa com jardim. Mas, por trás da fachada de tranquilidade, a família vive feliz, ao lado do campo de concentração de Auschwitz.
Mas Zona de Interesse não tem nenhum “interesse” em olhar para dentro do muro – e sim nos fazer refletir com a delicadeza de um soco no estômago como uma família consegue existir por anos imersa no som do horror, do medo e da monstruosidade como se nada estivesse acontecendo? Quem, de fato, são os monstros nessa guerra insensata, aqueles que as fazem, ou aqueles que se eximem? Talvez ambos.
“Zona de Interesse” é um pesadelo vivido, representado pelos sons. Não há imagens de atrocidades mas é através de ruídos, gritos, sons, estampidos e gemidos, que vêm de fora das cenas, que o horror é representado. Reforçando a clássica regra cinematográfica que diz que o não-visto é o mais assustador.
O som é o verdadeiro protagonista deste filme. Em suas nuances, em seus murmúrios sussurrantes e em seus gritos lancinantes, penetramos nas profundezas sombrias da alma humana.
O dia a dia destes personagens se desenrola entre os gritos abafados de desespero, de um genocídio em curso, do qual, eles também são diretamente responsáveis.
Zona de Interesse é um complexo caos de nuances tenebrosas, um labirinto moral onde a linha entre o bem e o mal se dissolve em um nevoeiro de crueldade, uma exposição brutal da humanidade em seu estado mais sombrio. Crianças brincando entre cinzas de mortos, uma mãe vestindo-se com roupas que pertenciam a alguém que acabou de falecer, um pai amoroso com sua família enquanto orquestra estratégias para ceifar dezenas de vidas diariamente.
Os horrores que ocorrem a poucos metros dela estão sempre presentes na sua atmosfera. Há poloneses escravizados dentro da casa; um jardineiro judeu se esgueira pela casa da família, em segundo plano. Em várias cenas vemos, de diferentes ângulos, as chaminés do campo e as torres de vigilância. O espaço jamais é totalmente o da vida privada.
Onde está a humanidade em meio a esse caos?
Em “Zona de Interesse”, não estamos apenas testemunhando um relato histórico, estamos encarando o espelho sombrio de nossa própria humanidade.
Zona de Interesse é um filme feito de sons, de silêncios e percepções o que de certa forma pode parecer “não acontecer nada”, mas ao contrário, onde nada é visto, tudo é sentido percebido e principalmente ouvido por nós. A tensão causada por esses seres de dúbia moralidade, nos mantem com olhos grudados na tela durante os 106 minutos de projeção.
Vale a pena destacar o trabalho da atriz Sandra Hüller, que concorre ao Oscar de melhor atriz, mas por outro filme também indicado ao Oscar, o excelente “Anatomia de uma queda”. Hüller é precisa na construção de uma Hedwig orgulhosa, manipuladora e vaidosa.
A fotografia do longa é incrível e perturbadora, a direção de Gleizer é precisa e não importa o quanto você já tenha visto no cinema sobre o Holocausto, “Zona de interesse” vai te mostrar pontos de vista totalmente diferentes, inéditos ou pouco usuais.
Imperdível, junto com “Anatomia de Uma Queda”, na minha opinião as grandes surpresas da temporada.